Regulamentação do Brasil sob pressão: governo aumenta carga tributária

Lygia Lais Rodrigues
Traduzido por Thawanny de Carvalho Rodrigues

O mercado de apostas esportivas segue enfrentando tempos turbulentos no Brasil. Em um curto intervalo, duas decisões do governo federal lançaram dúvidas sobre a coerência do processo regulatório em andamento. De um lado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu publicamente o aumento da carga tributária sobre as apostas online. De outro, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) anunciou que não tem mais recursos para seguir bloqueando sites ilegais — uma das estratégias centrais previstas na nova legislação para proteger o mercado regulado.

Embora independentes entre si, essas declarações e entraves orçamentários apontam para o mesmo cenário: o setor legalizado está sob pressão crescente, enquanto o mercado ilegal continua operando com relativa liberdade.

Lula quer mais arrecadação — e o alvo são as operadoras de apostas

Durante entrevista ao podcast Mano a Mano, publicada na semana passada, o presidente Lula afirmou que o setor de apostas contribui pouco com os cofres públicos. “As apostas são tributadas em 12% [sobre a receita bruta dos jogos]. Nós queremos que paguem 18%”, disse. Lula também defendeu o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) como alternativa ao corte de verbas de áreas essenciais como saúde e educação.

A fala ocorreu dias após a publicação do Decreto nº 12.227/2024, que elevou o IOF sobre transações com cartão de crédito no exterior — medida que impacta diretamente as apostas realizadas em sites estrangeiros. Em resposta, a Câmara dos Deputados aprovou regime de urgência para votar um projeto que visa derrubar o aumento. Apesar disso, o avanço da carga tributária sobre operadores licenciados parece contar com o respaldo do Executivo.

Anatel suspende bloqueio a sites ilegais por falta de verba

Paralelamente, a Anatel anunciou a suspensão temporária das ações de combate aos sites de apostas ilegais por falta de recursos. Segundo reportagens especializadas, o orçamento destinado a essas medidas foi congelado pelo Ministério da Fazenda, inviabilizando novas iniciativas contra plataformas não licenciadas.

A interrupção ocorre em um momento em que mais de 70 operadores já atuam com autorizações provisórias concedidas pelo governo. Essas empresas seguem investindo em conformidade, responsabilidade social e publicidade regulamentada. Enquanto isso, sites ilegais — muitos deles hospedados no exterior — continuam facilmente acessíveis ao público brasileiro, sem pagar impostos ou cumprir normas nacionais.

Alerta já havia sido feito no BiS SiGMA Américas 2025

O desequilíbrio entre exigências fiscais e fiscalização não é novidade — e foi tema central do painel Desvendando a Complexidade Tributária das Apostas no Brasil, realizado durante o BiS SiGMA Américas 2025. Especialistas alertaram que um sistema que penaliza quem atua dentro da legalidade, ao mesmo tempo em que ignora os que operam à margem da lei, compromete a integridade do processo regulatório.

Uma das declarações mais contundentes veio do advogado tributarista Juan Manuel Mendes, sócio do escritório VPN Advogados:

“A modulação de efeitos [nas decisões tributárias] acaba penalizando quem cumpriu e pagou tudo corretamente. […] Em situações em que alguém não pagou, por conta da modulação, esse também acaba não pagando.”

Originalmente direcionada à insegurança jurídica de decisões fiscais, a fala de Mendes ganha novo peso no contexto das apostas: as empresas que seguem as regras enfrentam novos custos e fiscalização mais rígida, enquanto operadores ilegais permanecem blindados pela inação institucional.

Retrocesso regulatório se torna risco real

Construir um mercado regulado de apostas no Brasil exige mais do que arrecadar tributos. É preciso garantir isonomia competitiva, previsibilidade fiscal e mecanismos eficazes de fiscalização. Quando o aumento de impostos não é acompanhado da capacidade do Estado em aplicar a lei, o risco é claro: desincentivar a formalização e fortalecer a informalidade.

O próprio arcabouço regulatório recém-criado pode ser comprometido caso os incentivos se tornem desalinhados. O resultado é perverso: o mercado legal recua, enquanto o ilegal avança.

Conclusão

A indústria de apostas no Brasil não se opõe à regulação — ela a reivindica. Mas o que espera em troca é equilíbrio. Uma carga tributária mais pesada, sem medidas eficazes contra o mercado ilegal, enfraquece o ambiente de negócios, mina a confiança e ameaça os avanços conquistados até aqui.

Como destacaram especialistas durante o BiS SiGMA Américas 2025, a sustentabilidade do setor depende menos de tributar mais — e mais de regular melhor.

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