Apostas online geram quase 20% das denúncias ao Conar em 2024, e maioria vem de sites ilegais

Júlia Moura
Escrito por Júlia Moura

A publicidade de apostas online se tornou uma das maiores dores de cabeça para o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) em 2024. Segundo dados divulgados pelo escritório de advocacia Kasznar Leonardos e reproduzidos pelo Valor Econômico, o setor foi o segundo mais denunciado por práticas publicitárias irregulares no país, ficando atrás apenas do segmento de alimentos. 

No levantamento, as apostas online foram responsáveis por 18,8% das representações éticas analisadas pelo Conar. O setor alimentício, líder no ranking, acumulou 23,1% das denúncias. Os dados mostram uma preocupação com a forma como as casas de apostas têm se comunicado com o público, especialmente em um momento de regulamentação e expansão acelerada do setor no Brasil. 

Infrações mais comuns 

Entre os principais motivos de denúncia, destacam-se: 

  • Ausência de alertas sobre restrição de idade, elemento essencial em qualquer anúncio envolvendo atividades potencialmente prejudiciais a menores de idade; 
  • Falta de cláusulas sobre jogo responsável, o que compromete o direito à informação do consumidor e ignora boas práticas de autorregulação; 
  • Presença de influenciadores menores de idade, o que é expressamente proibido em campanhas de apostas; 
  • Promessas enganosas, que podem induzir o consumidor ao erro, especialmente em um mercado ainda pouco compreendido por boa parte da população. 

A maior parte das infrações, no entanto, não parte das casas de apostas legalizadas ou em processo de legalização no país. De acordo com o presidente do Conar, Sergio Pompilio, cerca de 80% das queixas envolvem operadores ilegais. 

A dificuldade em coibir o ilegal 

Durante uma das sessões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Apostas Esportivas no Senado, Pompilio explicou o desafio enfrentado tanto pelo Conar quanto pelas autoridades públicas: “Muito conteúdo publicitário relacionado a bet já foi, sim, objeto de notificação, de alteração e suspensão. Mas o problema é que 80% das reclamações que nós recebemos envolvem bets não autorizadas. E quem controla o ilegal normalmente é a polícia”, afirmou. 

O presidente do Conar foi ainda mais direto, ainda durante a sessão: “Não é possível controlar uma empresa de bet que foi criada no continente asiático, com conteúdo totalmente em português, que opera pelas redes sociais e chega diretamente ao adolescente e à criança brasileira. Essa empresa é quase inalcançável hoje”

Ou seja, boa parte das denúncias não se refere a empresas que seguem os padrões de autorregulação ou as regras da nova legislação brasileira. São sites muitas vezes baseados no exterior, sem sede no país, e que usam influenciadores ou conteúdo visual chamativo para atrair apostadores — inclusive menores de idade. 

Para o Conar, um dos caminhos para lidar com essa publicidade irregular passa pelo apoio das plataformas digitais. “As redes sociais precisam colaborar e retirar do ar o conteúdo de operadoras ilegais assim que forem notificadas”, comentou Pompilio. 

A pressão por mais responsabilidade das big techs tem aumentado. Já há projetos de lei e discussões no Congresso sobre como tornar as plataformas digitais mais responsáveis pelo conteúdo de apostas e jogos de azar divulgados em suas redes. 

Proibir a publicidade é o caminho? 

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), relatora da CPI, chegou a questionar o presidente do Conar sobre a possibilidade de proibir toda publicidade de apostas no Brasil. Mas Pompilio defende que essa não seria uma solução eficaz: “O caminho de uma eventual proibição completa pode gerar muito mais confusão e prejuízos, porque você deixa um campo aberto às escuras para quem quiser atuar de maneira ilegal. É melhor ter um ambiente autorregulado e controlado pelo poder público e privado”, afirmou. 

Essa visão também é compartilhada por especialistas do setor. Para eles, ao proibir totalmente a publicidade, corre-se o risco de empurrar os consumidores para o mercado clandestino, onde não há regras claras, nem proteção ao jogador. 

Um mercado em crescimento 

Com a regulamentação avançando e novos operadores sendo licenciados, cresce também o número de campanhas publicitárias em plataformas como YouTube, Instagram, TikTok e podcasts populares. O desafio agora é garantir que essas campanhas sejam transparentes, éticas e voltadas exclusivamente ao público adulto. 

Segundo levantamento do portal PropMark, só em 2023, as casas de apostas investiram mais de R$ 2 bilhões em publicidade no Brasil. Esse número tende a crescer com a oficialização do mercado e a entrada de grandes players internacionais. 

O papel do Conar e das autoridades será equilibrar a liberdade de expressão comercial com a responsabilidade social. Isso inclui garantir que menores de idade não sejam expostos a esse tipo de conteúdo e que os consumidores recebam mensagens claras sobre os riscos do jogo. 

O problema vai além da publicidade, envolve também a presença de empresas ilegais, muitas vezes fora do alcance das autoridades brasileiras. Ao invés de proibir totalmente a propaganda, o desafio está em reforçar a fiscalização, responsabilizar as plataformas digitais e construir um ambiente mais seguro e transparente para todos. 

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