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No fim de dezembro de 2024, a Betano, casa de apostas muito conhecida no Brasil, comunicou aos parceiros o fechamento repentino do seu programa de afiliados no Brasil, alegando “reformulação estratégica” e necessidade de adaptação à nova legislação das apostas (Lei 14.790/2023). A decisão pegou de surpresa centenas de afiliados, que dependiam das comissões geradas pelos clientes indicados. Segundo relatos em fóruns e sites de reclamações, muitos afirmam ter sido cortados sem aviso adequado, sofrendo perdas financeiras imediatas (comissões deixaram de ser pagas) e abalo emocional. Na visão desses afiliados, a interrupção unilateral do contrato — geralmente comunicada apenas por e-mail ou aviso na plataforma — gerou demissões de equipes e cancelamento de investimentos em tráfego e marketing digital. Por outro lado, a Betano aponta que respeitou as cláusulas contratuais: o contrato previa expressamente rescisão sem justa causa por qualquer parte, com aviso prévio de apenas sete dias. Em outras palavras, nos próprios termos acordados, “cada parte pode rescindir este Contrato a qualquer momento (sem justa causa), mediante aviso prévio por escrito com sete (7) dias à outra parte”. A Betano argumenta ainda que a Lei 14.790/2023, sancionada em 30 de dezembro de 2023, revolucionou reguladoramente o mercado das apostas esportivas, impondo exigências de licenciamento e controles (como controle de lavagem de dinheiro, KYC dos apostadores etc.). De fato, em 30 de dezembro a Betano Brasil (Kaizen Gaming Brasil Ltda.) recebeu autorização provisória do para operar no mercado regulado. Nesse cenário de “transição regulatória”, a empresa diz ter reestruturado contratos, pedindo recadastramento de parceiros. Para os afetados, porém, trata-se de manobra empresarial que simplesmente cortou comissões de parceiros externos sob pretexto legal.
Os ex-parceiros da Betano eram em geral profissionais de marketing digital ou pequenas empresas especializadas em atrair apostadores para a plataforma. Eles colocavam em prática diversas estratégias de tráfego, incluindo conteúdo em sites e blogs (notícias e análises esportivas com banners e links de afiliado), vídeos em canais especializados no YouTube, avaliações e resenhas de casas de apostas, além de publicações em redes sociais e campanhas de e-mail marketing. Muitos também compravam tráfego pago (anúncios em Google ou Facebook) direcionado a perfis de apostadores. Esses afiliados investiam em domínios, hospedagem, produção de conteúdo e ferramentas de automação de marketing, na expectativa de receber comissões por cada aposta realizada por usuários que indicassem. O modelo de remuneração era tipicamente de revenue share (20% da receita líquida gerada pelos jogadores que trouxessem) acrescido de bônus de “custo por aquisição” (um valor extra sobre o primeiro depósito do jogador). Em português claro: o parceiro recebia cerca de 20% da margem da casa sobre as apostas de seus indicados, mais bônus iniciais. Importante notar que, segundo as regras do programa Betano, todas as perdas pagas aos usuários (prêmios ganhos) eram deduzidas do saldo do afiliado – isto é, se os jogadores que indicaram ganhassem muito dinheiro, parte da comissão do afiliado era anulada. Tal sistema pode gerar meses com saldo negativo a ser recuperado nos meses seguintes. De toda forma, os afiliados de cassino/apostas têm valorizado esses ganhos residuais.
Do lado da empresa, a estratégia de defesa incluirá os pontos contratuais e regulatórios. Em primeiro lugar, a Betano vai enfatizar que agiu dentro do que foi acordado: o contrato de afiliados deixa claro que não há vínculo empregatício e que o programa pode ser encerrado conforme a vontade das partes. Em nota, provavelmente apontaria que os afiliados estão em posição de liberdade simétrica – qualquer um poderia ter cancelado o contrato se quisesse. A Betano também irá apresentar como defesa a nova exigência legal: a partir de 2025 só podem operar no Brasil plataformas devidamente licenciadas e com estruturas de compliance. Assim, qualquer material de divulgação ou parceria precisa estar adequado à regulamentação federal. A empresa pode alegar que, ao finalizar o contrato atual, convida os afiliados a recadastrarem sob novos termos compatíveis com a legislação – exatamente como ocorre com outros prestadores de serviço que precisam se readequar à lei. A Betano provavelmente irá dizer que ofereceu total transparência (o site exibia seu CNPJ e autorização oficial da Fazenda em local visível) e que aplicou a simetria contratual prevista no art. 421-A do CC, já que os termos eram iguais para ambas as partes. Outro argumento é que, nos contratos, o afiliado também tem obrigações: não podia trafegar em áreas restritas, não podia usar sub-afiliados não-autorizados etc. (cláusulas 3.7, 5.24 do contrato). Assim, qualquer argumento de “prejuízo” terá que enfrentar a versão de que a empresa se limitou a exercer direitos contratuais legítimos e a cumprir as novas exigências legais.
Segundo um levantamento conjunto da Datahub e do portal Aposta Legal Brasil, o setor de apostas esportivas dobrou de tamanho em 2023 – cresceu cerca de 135% entre agosto/22 e agosto/23. Estima-se que os brasileiros movimentaram entre R$100 e R$120 bilhões nas bets em 2023, cerca de 1% do PIB nacional. A Betano, entre as operadoras estrangeiras, lidera esse mercado: controla cerca de 23% de participação no Brasil, à frente de concorrentes como Bet365. A aprovação da lei 14.790/23 (a “Lei das Bets”) já fez o governo liberar autorizações provisórias para dezenas de marcas para operar em 2025. Em um levantamento de 31/12/24, a Fazenda anunciou que 95 bets (soma de licenças definitivas e provisórias) estavam regularizadas para o ano seguinte. Ainda assim, outros grandes patrocinadores de times (como Pixbet e Parimatch) ficaram de fora da lista oficial. Nesse contexto, especialistas de direito digital e tributário dizem que a nova lei introduziu regras rígidas de transparência e tributação: operadoras devem exibir razão social, CNPJ e portaria de autorização em local visível, e foram criados tributos sobre a arrecadação das casas de apostas (como a “taxa de fiscalização” mensal e 12% de contribuição ao esporte e saúde, além de imposto de renda sobre prêmios). A regulamentação também busca proteger o apostador (vedando marketing enganoso, determinando prevenção à ludopatia etc.). Neste cenário, o caso Betano levantou um debate sobre práticas de empresas estrangeiras no Brasil: em fóruns de marketing afiliado, donos de sites de apostas comentam que o episódio pode ser um “sinal de alerta” – afinal, outras operadoras também mantêm programas de afiliados sem contratos.
Este artigo foi produzido com base em informações fornecidas por Fred Azevedo Beta em: https://www.fredazevedo.com/post/afiliados-betano-acao-judicial-brasil